quinta-feira, 28 de outubro de 2010

Dois ovos, farinha e fermento, muito fermento

Nem sempre as coisas são tão fáceis como inicialmente se imagina.
Não sei se você já tentou fazer um bolo, ou uma receita qualquer, e apostou ser improvável que viesse a dar errado. Não fazemos nada achando que vai dar errado, pelo menos eu. Sempre faço tudo pra dar certo e, principalmente, que vai dar certo. E tem sido assim há 27 anos.
Tô falando isso porque depois de ver o bolo pronto e saboreá-lo é bom, e fácil elogiar. Fazer também é, mas nem sempre é tão fácil, o que não faltam são pessoas para dar opinião nonsense, sem saber que tudo que você aprendeu ao longo do tempo foi usado naquela receita e foi junto ao forno.

São lições, atalhos, expedientes usados, tudo o que deu certo e o que não deu. A hora de colocar e de retirar do forno. Onde ir buscar os melhores ingredientes e de que forma aplicá-los, assim como saber tirar o melhor deles. Enfim, fazer acontecer e fazer com que fique bom, outra vez.

Dia 05/11 estreia, oficialmente, minha banda Gafieira Soul. Pronta. Saindo do forno.
E venho bem acompanhado. Trago a confiança, a amizade e a cumplicidade de Rico e de Flávio, temos crescidos juntos e só saberemos o valor disso mais adiante. E trazemos também o talento de Riva, a segurança de Israel, o astral de JP, a energia de Faxineira e o brilho de Lara. Todos se encaixaram nesse nosso quebra-cabeça, ou melhor, nessa receita.

Com uma pitada de cada um deles, fizemos a Gafieira Soul e dizemos, por isso, que a banda toca dobrado. Eu aumentaria essa multiplicação, mas é preciso humildade, sempre ousadamente humilde. Por isso, aguardo todos por lá. Ou melhor, aguardamos todos por lá (no plural porque são 3 chef's).

quinta-feira, 21 de outubro de 2010

Novo pneumotórax


Meu diagnóstico foi feito. Minha doença se chama poesia.
Não sei que poesia é só para recitar. Eu acredito. Acho que poesia é para viver.
E os poetas são todos doidos. Poesia é uma forma de loucura.
Veja só: o Fernando Pessoa diz “Tudo menos ter razão!” Se ele fosse normal diria o contrário, “Tudo menos não ter razão!”.
É por isso que os normais brigam uns com os outros, especialmente marido e mulher: cada um quer provar que está com a razão. Razão é o que todo mundo pensa e faz. Qualquer idiotice que seja feita por todos passa a ser considerada sabedoria.
(...) Isso que normalmente damos o nome de razão são máscaras, mentiras, equívocos, farsas. A nossa verdade anda sempre enterrada.

Rubem Alves

quarta-feira, 13 de outubro de 2010

Sobre simplicidade e sabedoria

Diz o Tao-Te-Ching: "Na busca do conhecimento a cada dia se soma uma coisa. Na busca da sabedoria a cada dia se diminui uma coisa."
(...)
Sabedoria é a arte de degustar. Sobre a sabedoria Nietzsche diz o seguinte: "A palavra grega que designa o sábio se prende, etimologicamente, a sapio, eu saboreio, sapiens, o degustador, sisyphus, o homem do gosto mais apurado." A sabedoria é, assim, a arte de degustar, distinguir, discernir. O homem do saberes, diante da multiplicidade, 'precipita-se sobre tudo o que é possível saber, na cega avidez de querer conhecer a qualquer preço.' Mas o sábio está à procura das 'coisas dignas de serem conhecidas'. Imagine um bufê: sobre a mesa enorme da multiplicidade, uma infinidade de pratos. O homem dos saberes, fascinado pelos pratos, se atira sobre eles: quer comer tudo. O sábio, ao contrário, para e pergunta ao seu corpo: 'De toda essa multiplicidade, qual é o prato que vai lhe dar prazer e alegria?' E assim, depois de meditar, escolhe um...

A sabedoria é a arte de reconhecer e degustar a alegria. Nascemos para a alegria. Não só nós. Diz Bachelard que o universo inteiro tem um destino de felicidade.

O Vinícius escreveu um lindo poema com o título de "Resta..." Já velho, tendo andado pelo mundo da multiplicidade, ele olha para trás e vê o que restou: o que valeu a pena. 'Resta esse coração queimando como um círio numa catedral em ruínas...' 'Resta essa capacidade de ternura...' 'Resta esse antigo respeito pela noite...' 'Resta essa vontade de chorar diante da beleza...'. Vinícius vai, assim, contando as vivências que lhe deram alegria. Foram elas que restaram.

As coisas que restam sobrevivem num lugar da alma que se chama saudade. A saudade é o bolso onde a alma guarda aquilo que ela provou e aprovou. Aprovadas foram as experiências que deram alegria. O que valeu a pena está destinado à eternidade. A saudade é o rosto da eternidade refletido no rio do tempo. É para isso que necessitamos dos deuses, para que o rio do tempo seja circular: 'Lança o teu pão sobre as águas porque depois de muitos dias o encontrarás...' Oramos para que aquilo que se perdeu no passado nos seja devolvido no futuro. Acho que Deus não se incomodaria se nós o chamássemos de Eterno Retorno: pois é só isso que pedimos dele, que as coisas da saudade retornem.
(...)
Aí eu consulto o meu bolso da saudade. Lá se encontram pedaços do meu corpo, alegrias. Observo atentamente, e nada encontro que tenha brilho no mundo da multiplicidade. São coisas pequenas, que nem foram notadas por outras pessoas: cenas, quadros...

Diz Guimarães Rosa que 'felicidade só em raros momentos de distração...' Certo. Ela vem quando não se espera, em lugares que não se imagina. Dito por Jesus: 'É como o vento: sopra onde quer, não sabes donde vem nem para onde vai...' Sabedoria é a arte de provar e degustar a alegria, quando ela vem. Mas só dominam essa arte aqueles que têm a graça da simplicidade. Porque a alegria só mora nas coisas simples.


(Rubem Alves, "Concerto para corpo e alma", pg. 09.)

quinta-feira, 7 de outubro de 2010

Rafa de sapato novo!

Peço licença pra mudar de nome.
Antes meu dono me chamava de rafaelfonsecademelo, mas achou por bem me dá essa nova alcunha: rafadesapatonovo.

Se isso fosse na vida real seria uma burocracia danada. Ele mesmo disse que precisava de um processo, uma ação, se justificar pro juiz, falar com um tal de Ministério Público, e blá, blá, blá.
Daí fiquei cansado só de ouvi-lo, e olhe que ele fala!

De sapato novo porque é assim que passo a caminhar. Com um novo pisar. E a partir de agora só vou onde os novos sapatos me mandarem. Rafa também me disse que o soneto que ele mais gostava era o do 'desmantelo azul', de um tal Carlos Pena Filho. Tá. Mas... o que eu tenho a ver com isso?
O que um espaço feito pra parar um pouco o que está acontecendo na vida real - que é tão chata quanto previsível - e entrar num mundo que é só dele, tem com isso?!

É que Rafa acaba de pintar de azul os seus sapatos, por não poder de azul pintar as ruas. E foi daí que nasci!
Ando, disse ele - literalmente - de sapatos novos. Pense em como você se sente de sapato novo: o comprou pra usar com aquela roupa, e sair pra'quele lugar, talvez pra mostrar aos outros. Ou pra correr melhor, jogar melhor, viver melhor.

E é exatamente assim que Rafa tá. De sapatos novos. Na alma, nos pés.